Um hospital que começou a ser construído em 2001 e 22 anos depois ainda não foi concluído. Uma Unidade de Pronto Atendimento que está em obras desde 2015. E uma reforma que deveria durar alguns meses mas já se estende há quatro anos. Os atrasos em obras de unidades de saúde têm prejudicado a população de Pedras de Fogo, Esperança e Conde, na Paraíba, e feito com que moradores se desloquem por quilômetros até outros municípios para ter atendimento médico.


Esta é a primeira parte da série do JPB2, “Obras Inacabadas: 2ª Temporada”, em que os repórteres Laerte Cerqueira e Beto Silva viajaram por 11 cidades, do Litoral ao Sertão, visando averiguar obras que foram iniciadas por gestores públicos, mas que nunca foram finalizadas, representando um grave prejuízo de dinheiro público. As reportagens desta nova temporada foram baseadas em mensagens enviadas pelos telespectadores dos telejornais da Rede Paraíba de Comunicação, durante a exibição e após o fim da primeira temporada da série, que foi ao ar em julho de 2023.


Hospital inacabado há 22 anos



Pedras de Fogo fica no Litoral Sul da Paraíba, há 50 quilômetros da capital João Pessoa. O hospital do município começou a ser construído em 2001, pelo Governo do Estado. Em 2002, a obra foi municipalizada.


Boa parte da estrutura, nos 2,7 mil metros quadrados da construção, ficou pronta pouco tempo depois, mas parou aí. Dezenas de salas que deveriam ser consultórios para atendimento da população estão abandonadas. Anualmente, milhares de pessoas que poderiam ser atendidas na unidade estão tendo que viajar para Itabaiana ou para João Pessoa.


“Se eu for contar os prefeitos que já entraram e saíram e até agora nada, se eu for fazer a conta, acho que o caderno, de cima a baixo, vai encher. Entra prefeito, sai prefeito, entra deputado, sai deputado, e nada. Cadê o hospital? Cadê o socorro? Não tem, tem que ir para João Pessoa”, diz a dona de casa Josefa Maria da Conceição.

O hospital foi pensado para beneficiar 100 mil pessoas de Pedras de Fogo, Pitimbu, Juripiranga, Pilar e São Miguel de Taipu. O tamanho da construção é impressionante e a estrutura é bem feita. Porém, após duas décadas de abandono, o local já sofre com os efeitos do tempo: infiltrações e rachaduras são recorrentes nas paredes, piso e teto. Equipamentos ainda na caixa estão abandonados nos corredores, muitos enferrujados ou quebrados. Já a estrutura elétrica, que havia ficado pronta, foi furtada.

“É um sentimento de frustração, porque a cidade tá crescendo, evoluindo, e foi muito dinheiro investido aqui. Dinheiro que vem do nosso bolso”, contou a também dona de casa Nataly Alexandre.

Até 2017, foram investidos quase R$ 1,5 milhões na construção. Em 2019, o Ministério Público da Paraíba abriu um inquérito para cobrar uma solução.



“Nós estamos nesse procedimento para ver se o município recoloca o serviço para funcionar. Nós estamos fazendo um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para que ele realmente conclua este hospital, e nós vamos dar um ano e dois meses para terminar”, explicou o promotor de Justiça Marinho Mendes.

A atual gestão prometeu terminar a obra nos próximos meses, mas a conclusão vai custar pelo menos quatro vezes mais do que o valor inicial da construção.


“A gente já tem o dinheiro, R$ 8 milhões, na conta. A obra é R$ 10,6 milhões, e a prefeitura entra com R$ 2,6 milhões. O tempo da conclusão é de um ano, mas eu vou pressionar muito essa firma para ela terminar mais rápido”, disse o prefeito de Pedras de Fogo, Ba Barros.


A ordem de serviço para o andamento da construção foi assinada em 19 de setembro, 20 dias após a gravação da reportagem no município.



Reforma demorada


Esperança fica no Agreste paraibano, a 27 km de Campina Grande. Na metade de 2019, o único hospital do município fechou para reforma e ampliação. Como a unidade é referência para a população da cidade e de municípios vizinhos, os moradores acreditam que a reabertura seria rápida. Mas isso não aconteceu, e os pacientes agora dependem do sistema de saúde de Campina Grande para alguns tipos de atendimento.


“Qualquer coisa, qualquer urgência, qualquer fratura, não tem raio X, não tem cirurgia, não tem parto, tudo é Campina Grande. Aqui agora só há atendimento clínico e consultas, não só para nós, mas também para moradores de Areial, Montadas, Remídio, que sempre vinham para cá”, conta Edilene Fernandes da Costa, que é dona de casa.

 

Os serviços do hospital estão provisoriamente sendo feitos na antiga maternidade da cidade, que virou uma unidade de saúde improvisada, mas a falta de alguns serviços tem incomodado a população.


“Tá fazendo muita falta, porque a gente precisa dos atendimentos. A população vem sofrendo. Tem uma dor de cabeça, tem que ir pra Campina Grande. E além disso, também tem que ter dinheiro para a comida, para, às vezes, pagar um acompanhante. E cadê, que ninguém tem? A gente esperava que fosse abrir logo, para atender a população mais carente, que precisa de um atendimento do SUS”, disse o agricultor Francisco Alves Pequeno.

 


 Segundo a prefeitura de Esperança, o atraso na conclusão da reforma se deve a desistência de duas empresas que foram contratadas para a execução da obra.

“A gente tá com um prazo para terminar de seis meses. Até, no máximo, março de 2024 a gente vai estar finalizando essa obra. Hoje ela está em torno de 85% concluída, realmente falta pouca coisa para terminar: o pedaço de um piso, algumas portas para serem colocadas, a pintura, são detalhes”, explica o engenheiro civil da prefeitura Matheus Fernandes.



Em relação às denúncias de que os serviços ficaram prejudicados com a reforma, a secretária de Saúde da cidade, Cecília Alexandre, nega.

“Os atendimentos permanecem da mesma forma que acontecia no prédio que está em reforma, na mesma quantidade, de 2.500 a 3 mil atendimentos por mês. A única coisa que a gente não conseguiu colocar para funcionar, infelizmente, porque a gente usa um prédio que era da antiga maternidade e que não nos dava condições, foi o centro cirúrgico, mas mesmo com essa deficiência, a gente consegue atender toda a demanda de cirurgia, que é pelo [programa do Governo do Estado] Opera Paraíba. As cirurgias são realizadas em Campina Grande e em alguns casos em Solânea, mas o município dá todo o suporte, de exames e de transporte”, disse.

As obras da reforma do hospital foram retomadas cinco dias após a equipe de reportagem passar pela cidade, em setembro.

UPA incompleta e depredada



O município do Conde fica no Litoral Sul e faz divisa com João Pessoa. Lá, a população aguarda a conclusão da construção de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) há uma década. O convênio com o Governo Federal foi firmado em 2013 e o investimento inicial foi de quase R$ 2 milhões. Paralisada desde 2015, a prefeitura retomou a construção em 2021, e gastou mais R$ 500 mil de recursos próprios. Porém, a empresa não continuou a obra, que parou por falta de dinheiro.

A aposentada Marizete Alves da Silva é revoltada com a situação:

“Eu sei que as janelas de vidros levaram todas, não tem mais nenhuma. Além disso, aqui não tem hospital. Às vezes, até pra pegar uma ambulância, é de duas a três horas para ela chegar na porta da gente”, contou.

No local da construção, a sensação de revolta de dona Marizete é justificada. A estrutura está pronta, já haviam sido feitas instalações de forros, portas, janelas e até da rede elétrica. Mas o que se vê, atualmente, é destruição: do forro ao chão, tudo foi destruído por ladrões que furtaram os cabos de energia. Uma porta de vidro foi levada, e apenas mais uma segue ainda no lugar, que não tem proteção por meio de muros, grades, porteiros, portões ou vigilantes.


A prefeitura do Conde diz que a empresa que foi contratada para executar a obra deveria ter feito a segurança do local para evitar o vandalismo.

“Em parte destes furtos, a empresa ainda tinha o contrato vigente, e era responsável até mesmo por isso. Alguns materiais foram retirados pela própria prefeitura, para evitar depenarem a obra e tirarem as coisas de dentro. [Na época] Foi acionada a Polícia Civil, e também a gente notificou a empresa relatando o que estava faltando e que já tinha sido pago pela gestão”, disse o secretário de Planejamento do Conde, Márcio Simões.



Uma nova pactuação com o Governo Federal está sendo feita. Um novo projeto, com nova liberação de receitas, deve ser apresentado, o que representa mais custos para os cofres públicos.

“Nós fizemos todas as atualizações das tabelas e das planilhas para dar continuidade na obra em si, e a prefeita está batalhando atrás de novos recursos para poder dar seguimento e entregar essa obra tão importante para a população”, concluiu o secretário.

Fonte: G1 PB